Abaixo um texto que simplesmente define o meu modo de ver, pensar e sentir o mundo dentro das minhas percepções visuais, ou melhor, dentro desta experiência unicamente encantadora e sublime.
Agradáveis dias cinzas
(Marcelo Aramis - Jornal O Caxiense)
Natalia Bianchi tem olhos verdes que não conhecem a própria cor. No entanto, detectam em si mesmos – e no mundo ao redor – uma infinidade de traços, contrastes, volumes e texturas imperceptíveis aos olhares comuns. Os olhos da artista acreditam ser cinzas claros, com contornos cinza escuro e riscados por fissuras de diversos tons, do preto ao branco. Disseram a Natália que as cores que ela vê chamam-se preto, branco e cinza. Sem referências para questionar ou confirmar a hipótese, ela aceitou as definições. A artista tem explicações precisas sobre a sua visão limitada das cores, já a complexidade do seu olhar apurado para as formas parece ser inexplicável e sem limites. Na sua exposição de estreia, Natalia faz a autobiografia do seu jeito de ver.
Em uma sala aconchegante no segundo piso do Catna Café, o laranja pálido dos tijolos e o vermelho vivo das luminárias pendentes sobre as mesas fazem cenário e luz cinematográfica para os sete quadros da exposição. Um filme em preto e branco. Um clássico. As obras são resultado de uma investigação do uso do preto e do branco para atender a uma necessidade de conforto visual. Portadora de acromatopsia, uma doença genética que limita a visão aos tons de cinza e causa sensibilidade à luz direta, Natalia mostra uma série escura. O preto predomina e os cinzas e os brancos recortam detalhes e dão volume, profundidade e textura às composições.
Quando criança, Natalia escolhia qualquer canetinha para desenhar, preferia os contornos e raramente pintava os desenhos. Com o tempo, ela descobriu maneiras mais autênticas de preencher as formas. Hoje pinta um grande repertório de traços com uma restrita paleta de cores. Neta de costureira, Natalia cresceu entre tecidos e desenhos de moda. Na escola, essas percepções criaram rebuscados volumes e sobreposições nos vestidos das bonecas que ela gostava de desenhar – traços elaborados demais para uma menina da sua idade. Cada retalho de renda que ganhou da avó é para a artista um pedaço de nostalgia. Na exposição, os tecidos sentimentais fizeram carimbos ou receberam espessas camadas de tinta preta. São musgos em uma montanha, nuvens carregadas, fissuras de caverna. E se modificam constantemente.
Mutante como a própria obra, Natalia, formada em Artes, pós graduada em Poética Visual e com um pé na moda, inicia com originalidade no mundo das artes plásticas. Ela pinta para agradar o próprio olhar, egoísmo sem o qual a arte não teria sentido.
Nessa exposição, mais do que mostrar sua peculiar maneira de enxergar, a artista empresta a sua visão para quem estiver disposto a admirar a arte de um jeito diferente. Os olhos cinzas de Natalia tiram o brilho da TV, repelem os dias de céu limpo, descansam na neblina e adoram nuvens de tempestade. Os olhos verdes de Natalia só conhecem de nome as cores que eu enxergo. Mas têm o olhar mais profundo que eu já vi.
http://ocaxiense.com.br/2011/07/resenha-tres-cores-de-infinitos-tons/
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